terça-feira, 28 de junho de 2011

Por Addae Mbami, meu eu-lírico corrosivo

Camarada, tenho pensado numa coisa meio intrigante. Sei lá, essa noite longa – sim, três dias de noite, camarada, – está se tornando cruel, opressora. Não dá para sair do buraco, companheiro. E neste buraco não há vaginas, não há baseados, não há livros. A única poesia que tem é a que eu tenho que tirar de mim. Mas é um esforço do caralho, camarada, às vezes dói bastante, traz uma lembrança aterradora. Não quero mais ficar aqui, porra, será que é difícil de entender que estou descontrolado?
O quê? As coisas boas? Sim, tem um bocado de coisas boas em minha vida, mas todas elas são findáveis, deixam um gosto amargo na boca.
As paredes me apertam tanto, companheiro, esmagam minha garganta, grito, mas ninguém escuta. Parece-me impossível que não tenha ninguém aqui para abrir o coração e me deixar entrar ou, pelo menos, abrir as pernas e me deixar entrar também. Não há ninguém, camarada, e sozinho não é possível.
Camarada, se tivesse uma pistola cromada ao meu alcance, não sei, não. O que eu faria? Pensa bem, companheiro. Vinte anos de lutas e poucos avanços. Ser a vanguarda do proletariado não é fácil, Lênin deveria ter projetado isso. Não, porra, não é desse tipo de facilidade que eu falo. É preciso ter a mente forte, companheiro, e sozinho assim, como posso ser forte?
Esta noite, camarada, esta falta de tudo, toda a miséria que eu sei que há no mundo acabam comigo, me jogam cada vez mais para o fundo deste buraco terrível.
Não há corda que possa me tirar daqui, não há ninguém.

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